Nos anos de 2021 e 2022 ocorreram dois movimentos importantes relacionados ao emprego nos Estados Unidos: Great Resignation e Quiet Quitting. Embora distintos, esses movimentos compartilham algumas origens similares, como por exemplo a pandemia de Covid-19.
A pandemia não é, no entanto, a única responsável pelo aparecimento destes fenômenos, existem outros aspectos do próprio ambiente corporativo que contribuíram significativamente para as suas manifestações. Com a Covid-19 estas questões apenas se intensificaram porque, na verdade, já vinham se manifestando.
Como são fenômenos que nascem e impactam diretamente as empresas, é natural que se busque nas lideranças respostas e soluções. Este artigo propõe o debate sobre o papel dos líderes e as lições que os movimentos Great Resignation e Quiet Quitting nos deixaram.
Movimento Great Resignation
Great Resignation foi um fenômeno que levou a um grande volume de demissões voluntárias ocorridas em diversos segmentos empresariais nos Estados Unidos em 2021. Os motivos que leva às demissões voluntárias incluem o cenário após o primeiro ano da pandemia Covid-19 – muitos trabalhadores decidiram deixar seus empregos dando sinais de estarem repensando as suas prioridades. Além disso, sabemos que com o modelo de trabalho remoto, a carga de trabalho elevou-se exageradamente, gerando estresse, fadiga, desgaste e uma série de outras consequências negativas.
No Brasil, houve um movimento semelhante ao Great Resignation. Dados divulgados pela Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan) apontam para quase 3 milhões de pessoas que pediram demissão no primeiro semestre de 2022¹.
Nos EUA, a MIT Sloan Magazine Review buscou compreender melhor este movimento. Chegaram ao número de 34 milhões de profissionais que saíram por iniciativa própria de seus trabalhos. O mesmo estudo demonstrou que as empresas com uma cultura organizacional mais saudável tiveram percentuais mais baixos de demissão voluntária. Por outro lado, empresas reconhecidamente inovadoras tiveram índices maiores de demissão voluntária.
O que pode explicar porque algumas empresas sofreram mais do que outras no Great Resignation é o nível de atrito interno na organização. Este fator, inclusive, foi apontado como mais significativo do que a remuneração, por exemplo. O atrito interno denota o quanto a cultura organizacional pode estar sendo tóxica.
Entretanto, existem outros motivos deste movimento massivo de saída de trabalhadores, tais como:
- constantes reestruturações que geram, por sua vez, níveis maiores de insegurança nos profissionais;
- alto nível de inovação e as cobranças causadas pela expectativa do negócio direcionadas aos colaboradores;
- baixo reconhecimento do trabalho realizado;
- entre outras.
Movimento Quiet Quitting
O movimento Quiet Quitting apareceu um pouco depois do Great Resignation e significa desistência silenciosa. Desistência silenciosa é quando o profissional limita-se a desempenhar suas funções, não empregando, assim, mais esforço ou dedicação do que o mínimo necessário e trabalha apenas dentro do horário de trabalho estabelecido.
Alguns definem essa atitude como estar psicologicamente desconectado do trabalho ou até mesmo desengajado. Outros a enxergam como uma forma de contestação e uma imposição clara de limites entre vida pessoal e profissional. São pessoas que adotam o lema “trabalho para viver” e não o “vivo para trabalhar”.
Quiet quitting não deixa de ser considerado também um movimento geracional, porque vem se manifestando, em maior parte, em pessoas da Geração Z. A geração de profissionais nascida entre os anos 90 a 2000 apresenta outra mentalidade no trabalho, questionam sobre o papel que este deve ocupar em suas vidas. Além disso, são jovens que não têm intenção de passar a vida inteira na mesma organização, por exemplo. Procuram viver variadas experiências e em ambientes diferentes.
Impactos do fenômeno Quiet Quitting
Sobre o movimento Quiet Quitting a Gallup² fez um estudo no qual encontrou alguns dados interessantes:
O engajamento e a satisfação com o trabalho nas gerações mais novas (profissionais com 35 anos ou menos) caiu 6 pontos percentuais de 2019 para 2022
O percentual de jovens profissionais que acreditam que alguém se preocupa com eles, incentiva o seu desenvolvimento e que, portanto, possuem oportunidade de aprender e de crescer no ambiente de trabalho caiu 10%.
O percentual de profissionais em trabalho remoto ou híbrido que acreditam fortemente que possuem alguém encorajando seu desenvolvimento caiu para 12%.
Menos de 4 entre 10 jovens profissionais que trabalham de forma remota ou híbrida sabem claramente o que é esperado deles no trabalho.
Como se pode ver, tanto os fenômenos quanto os dados, nos levam a sinalizamos para a liderança destes indivíduos que seu papel e desafios são fundamentais e significativos.
6 Lições do Great Resignation e Quiet Quitting para Melhorar a Liderança
O que os movimentos Great Resignation e Quiet Quitting comunicam para as empresas é que as pessoas estão mudando sua forma de ver o trabalho. Os dois fenômenos falam sobre uma transição de valores e de um maior equilíbrio entre aquilo que é importante para as pessoas. Não é que o trabalho não seja um aspecto importante, todavia existem outros aspectos que também são. As lideranças e as empresas de maneira geral podem prestar mais atenção nos sinais que estão sendo enviados e passar a valorizar mais os seus colaboradores. Por meio da equipe de gestores, as empresas podem empreender ações nos seguintes sentidos:
Valorizar as pessoas como essenciais no negócio
O cargo de liderança costuma vir acompanhado de desafios e demandas, é verdade. Por outro lado, ele também costuma ser visto como uma forma de ter benefícios diferenciados e prestígio. Sem contar que é tido como uma forma de crescimento na carreira. Porém, antes de mais nada, ele significa que você lidará muito mais com pessoas. E para isso é preciso que você tenha curiosidade por elas e as valorize. Ou pelo menos as enxergue como parte essencial de seu negócio.
Então, enquanto líder, que valor você dá às pessoas? E como expressar este valor no dia a dia? Quais ações e atitudes você costuma apresentar que mostram o quanto elas significam para a sua gestão?
Aprender a comunicar e a conversar
Os estudos apontam que os jovens profissionais estão sentindo que existem poucas pessoas preocupadas com o seu desenvolvimento, por isso, pergunte-se: qual é a frequência e a qualidade das conversas que a liderança tem estabelecido com as equipes? A comunicação é uma das ferramentas mais disponíveis que temos. Será que ela está sendo utilizada da melhor forma? Será que existe oportunidade para melhorar e amplificar o seu uso? Você enquanto líder conhece o seu estilo de comunicação principal? Sabe que mensagem deixa quando interage com alguém da equipe? Este estilo está sendo eficaz e produtivo? Compreender estas questões é parte fundamental do papel da liderança.
Ser curioso e ouvir
Ao estar aberto para uma conversa significa também ouvir o que vem do outro. Para isso acontecer é preciso ser curioso e ter interesse de verdade no conteúdo alheio, mesmo que não concorde com ele. Dar ouvidos não quer dizer que você concorde com o que está sendo dito. Enquanto líder, você conhece as pessoas com as quais trabalha? Seus interesses, seus gostos, o que querem de suas carreiras? Seus desejos? Ou o diálogo que costumam ter é mais sobre as tarefas de trabalho mesmo?
Mostrar flexibilidade
Ao conhecer melhor as pessoas por meio do diálogo, da troca e da escuta, é possível se colocar no lugar do outro, com a cabeça deste que você ficou conhecendo mais, e agir com maior flexibilidade. Não significa ceder em tudo, mas sim abrir a possibilidade para considerar outros cenários. É uma forma de negociar aspectos importantes para os dois lados. Os profissionais hoje valorizam esta atitude de abertura em uma liderança.
Promover o autoconhecimento e o desenvolvimento
Permita que o seu liderado experimente suas diferentes habilidades, conheça o seu potencial, caminhe em diferentes direções. Enquanto isso, você e ele, avaliam sua performance durante o trajeto, estimulando a reflexão de como ele foi, as dificuldades que sentiu, as surpresas positivas que teve, os resultados que colheu. Com isso você estimula uma trajetória de carreira própria dele, com novas descobertas, escolhas e novas possibilidades. Você, enquanto líder, auxilia para que seu liderado amplie a visão das oportunidades dentro ou até mesmo fora do negócio.
Entenda a cultura organizacional
Prestar atenção nos elementos culturais internos é também papel do líder. Assim como conhecer as dinâmicas internas – a forma como as pessoas se comunicam, se relacionam, como organizam seus processos e fluxos – auxilia o gestor a identificar as mensagens que aquele negócio está enviando para as pessoas que ali trabalham.
Existe prioridade nas atividades? Ou tudo, de certa forma, é importante? Os projetos começam e terminam? Ou eles estão sempre mudando de direcionamento? Como está a carga de trabalho das equipes? Elas estão se sentindo sobrecarregadas? É um sentimento geral ou de uma parte da organização? Acontece mais em algumas áreas do que em outras? Como o excesso de trabalho está sendo manifestado pelas pessoas? Tenha em mente estas perguntas, prestando atenção, portanto, aos sinais expressos por elas é uma forma de identificar a cultura.
Todas estas ações são formas de trabalhar o engajamento no ambiente empresarial e evitar os movimentos Great Resignation e Quiet Quitting. Aqui foi salientado o papel da liderança, porém, claro, eles mesmos também devem ser desenvolvidos para as executarem. Por estarem em contato direto com as pessoas, os gestores são sempre os mais lembrados como participantes ou responsáveis diretos das questões organizacionais. No entanto, a empresa tem a responsabilidade de os auxiliarem e os apoiarem em seus desafios de gestão.
Seja você um líder que está em busca do próprio desenvolvimento ou uma empresa que deseja promover ações de desenvolvimento, tenho certeza que posso auxiliá-los com os serviços que ofereço. Consulte Serviços de Consultoria em Recursos Humanos para Empresas e Serviços de Consultoria de Carreira para profissionais.
De onde saíram essas idéias
- ¹ De janeiro a maio de 2022, 2,9 milhões de trabalhadores pediram demissão voluntária no país (Firjan)
- ² Is Quiet Quitting Real? (Galup)
- The Great Resignation, Quiet Quitting e o papel da liderança (Fia Online)
- Toxic Culture Is Driving the Great Resignation (MIT Sloan Management Review)
- Quiet quitting: fenômeno é tendência mundial e desafia líderes do futuro (Exame)
- “Quiet quitting”: fenômeno critica exaustão no trabalho e pode ressignificar o que é a boa performance (InfoMoney)
- Quiet quitting, a nova e ruidosa tendência do mundo corporativo (Veja)
- “Quiet Quitting”, fenômeno nas redes sociais, é uma forma de reação à vida real (Jornal da USP)
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